Uma nota jurisprudencial ao regime simplificado de tributação em sede de IRS

Serve o presente escrito de alerta para um recente acórdão do Supremo tribunal Administrativo (STA) que veio, de certa forma, por termo a uma prática da administração fiscal no que diz respeito à cessação da aplicação do regime simplificado em sede de IRS, obrigando os sujeitos passivos a ter contabilidade organizada sempre que, depois de decorridos três anos no regime simplificado, estes tivessem, no último ano, ultrapassado um dos limites previstos no n.º 2 do art. 28.º do Código do IRS.


A determinação dos rendimentos empresariais e profissionais, com excepção do regime de imputação previsto no art. 20.º Código do IRS, faz-se com base na aplicação das regras decorrentes do regime simplificado ou com base na contabilidade dos contribuintes, nos termos do n.º 1 do art. 28.º Código do IRS .

Nos termos do n.º 2 do referido preceito, ficam abrangidos pelo regime simplificado os sujeitos passivos que, no exercício da sua actividade, não tenham ultrapassado no período de tributação imediatamente anterior qualquer dos seguintes limites:

- Volume de vendas: 149 739,37;
- Valor ilíquido dos restantes rendimentos desta categoria: 99 759,58.

Assim, o regime simplificado abrange os sujeitos passivos que, no exercício da sua actividade, não tenham ultrapassado no período de tributação imediatamente anterior qualquer dos limites acima indicados e não tenham optado pela determinação dos rendimentos com base na sua contabilidade na declaração de início de actividade ou seja, até ao fim do mês de Março do ano em que pretendem alterar a forma de determinação dos rendimentos, mediante a apresentação de declaração de alterações.


Nos termos do n.º 5 do artigo 28.º Código do IRS, o período mínimo de permanência em qualquer dos regimes a que se refere (simplificado ou contabilidade organizada) é de três anos, prorrogável por iguais períodos, excepto se o sujeito passivo comunicar, até ao fim do mês de Março, a alteração do regime pelo qual se encontra abrangido.

O que significa que, não sendo exercida essa opção, se prorroga automaticamente, por igual período, o período de permanência do mesmo no regime simplificado por que esteve abrangido no triénio anterior. Só não será assim, cessando por isso o regime simplificado, se algum dos limites previstos no n.º 2 do artigo 28.º Código do IRS tivesse sido ultrapassado em dois períodos de tributação consecutivos ou num único exercício em montante superior a 25% desses limites, caso em que a tributação pelo regime de contabilidade organizada se faria, então, logo a partir do período de tributação seguinte ao da verificação de qualquer desses factos.

Assim, eventualmente o ultrapassar, no último ano (ou em qualquer outro dos três), de algum dos limites indicados no n.º 2 do art. 28.º, apenas releva caso seja superior a 25% desses limites.

No caso concreto apreciado pelo STA, estava em causa um sujeito passivo que foi oficiosamente enquadrado pela administração fiscal no regime de contabilidade organizada, porque, por no último dos três anos, ultrapassou um dos limites - os 99.759,58. Para fundamentar a sua posição sustentou que da interpretação dos n.ºs 2 e 5 do art. 28.º resulta que a prorrogação do regime simplificado de tributação (para o período de tributação seguinte) apenas se opera caso não ocorram quaisquer das situações consignadas no n.º 2 atrás referido, isto é, não seja formalizada a opção ou não seja excedido um dos limites.

Além disso, entendia ainda a administração fiscal que o n.º 6 do art. 28.º se aplica apenas quando esteja a decorrer o período de tributação nesse regime, ou seja, na vigência de um período de três anos de permanência obrigatória do sujeito passivo no regime simplificado, e não no seu fim.

Esta interpretação é no entanto errada, pois, nos termos do n.º 6 do art. 28.º a prorrogação, e consequente permanência no regime simplificado, é automática e obrigatória, desde que o sujeito passivo não tenha comunicado a opção pelo regime de contabilidade organizada. Ou seja, apenas esta comunicação obsta à prorrogação automática, visto que, sendo ultrapassado algum desses limites, o enquadramento no regime de contabilidade organizada pode até acontecer antes do termo do período mínimo de permanência. Pode, por exemplo, no primeiro exercício o sujeito passivo ultrapassar 25% do limite de 99 759,58. Nestes casos, nos termos do n.º 6 do art. 28.º cessa logo o regime simplificado, aplicando-se o regime de contabilidade organizada no período de tributação seguinte.

Por outras palavras, a administração fiscal, nos termos do n.º 6 não necessita de esperar pelo fim do período mínimo de permanência para enquadrar o sujeito passivo no regime de contabilidade, podendo fazê-lo logo que seja ultrapassado qualquer um dos limites, seja no 1,º 2.º, ou 3.º ano.

Assim, no momento e para efeitos de verificação da prorrogação automática do período de permanência no regime simplificado apenas releva a opção pelo outro regime feita pelo sujeito passivo.

Não ocorrendo qualquer dessas causas de cessação, e não optando o sujeito passivo, findo o período mínimo de permanência, pelo regime de contabilidade organizada, renova-se automaticamente por igual período o enquadramento no regime simplificado, e no qual o qual se manterá até que opte pela determinação do rendimento com base na contabilidade ou o mesmo cesse pela verificação de alguma das situações previstas no n.º 6 do mesmo artigo.
 
FONTE: EXAME EXPRESSO
AUTOR: JOÃO CALDEIRA

Ver artigo

0 comentários:

Enviar um comentário